quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Paro, Respiro e Agarro

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Paro
Centro o olhar no infinito cego
Respiro o pó do mundo
Retenho a solidão de tudo
Inspiro ao segundo

Paro
Escuto através de mim
E dou voz ao silêncio
Casulo o fim
E jorra sangue intenso

Borboleta…

Paro
Agarro a minha mão,
Assim,
Com o coração…
E invento a lei
Dou a si o meu corpo
E desfaço o que criei.

Arde a dor
Mas não deflagra
Se a cercar…
E sem pudor
Em meus dedos
Aconchegar.
Paro
Respiro
E Agarro…

Entre Cara e Coroa

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Olá!
(Olá!)
Como estás?
(Estou bem)
Vem… Dá-me a mão.
(Tua mão? Onde está a tua mão?)
Vem… Segue recta… Não mudes de direcção…
(E agora, que vereda tomar? Sigo a esquerda ou a direita?... Quando paro para descansar?)
Hoje, bem sei, mais uma vez tiveste medo e curvaste o rosto a quem olhava para ti fixamente.
(Preciso de pegar nesse objecto requintado que me destrói aquilo que ainda me permite orgulhar de mim. Sinto o seu toque, o seu cheiro, a sua textura, o desenho da sua mente que só existe porque se apodera por segundos da minha – tão esquizofrénica e doente.)
Isso que ouves repetidamente não te tornará melhor a cada dia. É a acção de mudança que te fará elevar. Vem… Muda essa caixa de música velha e deixa tocar novos discos.
(Deixo cair esse objecto mortal no chão e fixo-lhe o olhar por instantes. Não… não… Não quero apodrecer e deixar cair lentamente aos pedaços esta minha carne leve e suave - para quem a sente em si – eu sei… eu sei que há muito a fazer ainda. O tempo não espera, sim… Disso não posso discordar. Mas, então, saberás determinar para onde vai com tanta pressa?)
Estás a ouvir esta música? Vês… Esta não te prende ao chão assim como esse objecto mortal que te cola a mente ao tecto e te transforma em pó em múltiplos minutos… Não compensa. São somente minutos. O prazer corrói, nem que seja só por minutos. Vem… liberta os braços e dá-me a tua mão…
(E se não tiver estação? Ou melhor, e se chegar ao final da linha e voltar novamente pelo mesmo trajecto? E se não passar de um simples comboio fantasma? – Bem, ao menos sei onde estás, aí perdido no chão, por entre os meus pés - Muitas vezes sinto que não me sinto e, no entanto, estou aqui. Quantas e quantas vezes, não me vejo e estou a olhar-me ao espelho. Outras, mesmo, grito e não me oiço. Sei que cheguei onde me chamas-te, mas fiquei confusa quando alguém me disse que não existo. – Pego nele e faço-lhe o uso mental de quem se usa dele.)
“Não existo… Não existo… Não existoooo…. Não existooooo… “ – O teu eco fez-se sentir em todo o meu corpo. Vibrou intensamente destruindo mais uma das minhas janelas acabadas de arranjar. Tinha, inclusive, adornado o seu parapeito. Pequenas luzes coloridas acompanhavam flores de Primavera arrumadas em jarros moldados e pintados à minúcia por mim. Tanto carinho ali colocado. Porque não moves a expressão? Isso irrita-me. Nem imaginas o quanto.
(Não me interessa saber se sei ou se julgo saber. O saber não ocupa lugar porque vai destruindo-se a si mesmo à medida que se amontoa. O saber é o cancro da mente. E o corpo o seu discípulo. – A LUZ… onde está a LUZ que me acende o sentido da acalmia? – Não quero saber. Não quero saber. Não quero saber. Não! Queria antes saber onde está esse outro objecto indispensável. Para quê? Para nada saber. Sim, nada saber. Saber NADA, Saber de NADA, Saber a NADA… Sim, como é bom beber NADA. Não esse NADA que nos trás para o tudo, mas o NADA que nos livra da maré e nos trás de volta à areia da praia. É, sempre, então, que me volto e me apercebo da cor do sol. Sei que não lhe consigo chegar, mas tenho a areia que aquece e me dá conta da sua presença intensa. – O gosto incomoda-me. É sempre como um primeiro beijo. Os seus olhos beijam-me mais profundamente a alma do que os seus doces e húmidos lábios.)
Que procuras tu afinal? Já não sinto a mão de tanta espera. Falas de beijos e alma, de olhos, de Seus… doces e húmidos. Alguma vez te desfizeste aos bocados? Tinhas a certeza absoluta de que esses Seus lhes pertenciam? Um dia também eu me deitei na areia e vi que havia um sol, mas recusei-lhe os raios oferecidos. Perfuravam demasiado a minha pele frágil. Frágil? Qual frágil! - Não é que não goste de ofertas, mas já tenho a casa atulhada de bugigangas. Não que não me sejam úteis, mas não suporto ofertas. Quero comprar com o meu dinheiro. – Mas... espera! Talvez não seja exactamente oferta. Talvez seja o prémio por aguentar mais uma noite fria. Não, sendo assim já não os renego.
(Pensamento! Pensamentozinho! Onde estás pensamento! Ah, que maravilha! Não há pensamento. Agora só há oscilação de montanhas e penhascos. Há um abismo que não assusta à minha frente e trilhos de espinhos de rosa que se parecem com agulhas de malha da minha avô. Oh, a minha querida avô! Não! Eu tinha duas avós. Ambas não eram, porque são a minha raiz. As minhas duas, duas de duas avós, duas raízes distintas de dois solos diferentes. Solos férteis. – Oh pensamento duvidoso… que bom escapar-te! Só há perguntas que não exigem resposta. E os penhascos e montanhas recusam seguir a sua própria recta e continuam oscilando ao som desta música que já riscou há mais tempo que o próprio tempo. Sim, riscou e depois? – Oh, deixei cair detritos… - A minha mente não se apagou totalmente. Ganhou forças para gerir o seu Império de ruínas. E os penhascos e as montanhas seguem hipnotizados a minha voz serena de convulsão. Estou feliz. Sou feliz. Serei para sempre Feliz. Não preciso mais de Ti, nem do teu Tempo. Tenho o meu passo. Vês… também sei caminhar sozinha. Sei… Sei…Sei)
Sabes? Mas não dizias há pouco que não querias saber de nada. Estás a encher em vez de esvaziar. Ainda não te apercebeste? O Aperceber é mais difícil do que o não querer perceber, não é? Ás vezes tenho medo de te conhecer o fundo da estrada. Pareces bela aos olhos de alma, e sei que poucos olhos te vêm como tal, mas mesmo assim ainda te suavizas. Sei também que tens vontade. Essa é a mais nobre de todas. Nem todos têm vontade. Talvez por isso te pese demasiado o ferro atado ao pé: A vontade é a corrente que nos puxa para o alto, mas em pequenos saltos de cada vez. E tu só pensas em VOAR. Abrir asas e partir para bem longe. Mas e saberás pilotá-las assim tão tenras? E se quiseres regressar? Saberás tomar o caminho de volta? Bem sei que és saudosista.
(Sei… Sei… Sei… Sei… Sei o quê, afinal? - Penhascos e montanhas enrolam-se num só. Assim como dois corpos amarrados de amor que se tornam num só – SÓ? Não! Essa palavra não existe agora. Sim, essa sim. Quero ser UMA palavra apenas. Essa. Quero ser Agora. Agora para sempre. E porque no Agora não há tempo. No Agora não há Sangue. Ele foi e será sempre uma Alucinação. Ilusão, porque não pertence ao presente mas sim ao passado. [Todavia é também certo que se renova a cada passo. E renovação já é futuro. O Agora não é mais do que a estrada que, dos nossos passos dados a cada milésimo de segundo, deixamos para trás.] E quero desfazer-me no Agora. Porque o Agora não existe. E eu não quero existir. Não quero existir nem que seja por uns míseros minutos. - Sim, já sei o que estás a pensar. Não precisas de me olhar com esses olhos de contestação. Sei decore o que me vais dizer, por isso Cala-te. Dispenso. – O Agora para além de Ilusão é Poder: faz-me dona de mim. Sim, sou eu que tenho as rédeas dos penhascos e montanhas. Até o abismo se curvou à minha frente. Para teres noção, até criei paredes de espelho e com intenção. Estou contente. Apetece-me rir até sufocar. – E deixo de o ver. Perdi-o definitivamente. – Não faz mal. Os penhascos e as montanhas ainda dançam e o abismo continua de boca aberta sem esperança de alimento. – A música irrita de tão saborosa. O meu cabelo cheira bem.)
Já não aguento esse mesmo do-ré-mi. Como é que não te cansas? É impossível. Só mesmo tu. Só mesmo tu…
(Estou cansada sim… cansada da tua voz… Vai-te embora de uma vez por todas e leva a tua mão cheia de traças de tanto esperar por mim… Não vês que te renego… Renego-te por esses míseros minutos… Estes que tanto julgas… São eles que me fazem feliz… - E Sei… Sei… Sei…. Sei…)
Tu não sabes nada.... Não sabes nada … Não percebes que só queres uma MORADA. Revestida de calor e conforto no seu interior. É somente isso que procuras nesses míseros minutos de Agora… Tens o abismo ao teu lado e não te atemoriza, e sabes porquê?
> Porque não tens medo de cair dentro dele. Tens medo que ele caia dentro de ti. – Tê-lo aqui ao teu lado faz-te senti-lo, agarrá-lo, fitá-lo, controlá-lo, contempla-lo sadicamente, evitá-lo. A tua consciência apercebeu-se antes que te apercebesses dela.
(As pernas cruzaram-se na cadeira. A música continuou a tocar, a mesma, ainda com sabor, mas baça. Os penhascos e as montanhas relaxaram. O abismo… o abismo.... o abismo repetiu comigo: Lágrimas… Aquele Agora já era passado.)

[Fez-se tão tarde e nem me apercebi do tempo a correr. Estou confusa… Já nem sei onde estive, nem com quem dialoguei.]

(E a escrever esqueci-me dos meus medos, do vazio, da ansiedade, da solidão… E dele e Dele*…)
Tens a certeza do que te esqueceste realmente?
(Lá vens tu com as tuas perguntas para tudo!)
Não te esqueceste de mais nada?
(E ainda és chata… fonix! …Vá! Do que é que me esqueci, Oh sabichona?)
Então, do que está ao teu lado. Já não te lembras? Enquanto escrevias esqueceste-te de acender o objecto. Nunca chegaste a encontrar a luz.
(Raios parta! Onde raio meti a porcaria do isqueiro?)
É como te digo sempre Cristiana. Tu vives de tanta ilusão!

* O que queria que ele fosse.

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Eterna

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Do nada que me consome, sem voz, grito atormentada
A bela noite já caiu e as gentes dormem até ao dia raiar
Somente eu desenho nessas linhas de cobre acorrentada
As minhas mãos que anseiam as sedas da lua acariciar.
“Pano suave de cor vivaz
Cetim de aurora lilás
Amora eterna”
Em certa tela de pintura inacabada, meus olhos bebem
Peço-te a ti, vento, que me arrastes para onde nada existe
Atiro a minha mão aberta para que meus dedos agarrem
Esses trilhos fechados em que vil a voz muda persiste.
“Vento
Céu de ramos secos
Baloiço do que vai e vem
Demora
O que não tem
Empurra o agora
Agora”
Esta musica dita palavras que um dia cuidei serem minhas
Numa parede de folhas rasgadas colo olhares de beijo cego
Escrevo mil corações do incolor salgado dessas nuas tintas
Que são feitas de pérola, do doce silêncio em que me apego.

“Espelho
Rosto curvado em sombra
Velho
Fome de criança
Salto de bailarina
Esperança Purpurina”
Do nada que me consome, continuo infame a escrever
Os olhos bebem, os dedos agarram, a voz muda entoa
Mas a bela noite, triste, diz-me que já é hora de recolher
E o meu corpo cai, aquecido nesta asa que jamais voa.
“A lua sopra a luz das estrelas
Cega o tempo
Apaga o desenho
E o mar ondula calmo de espera
Nova noite acordará
Porque em mim a noite é eterna…”

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Ausente

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Sentei-me
Ausente
Neste chão, friamente,
de pedra maleável
Além...
Deitei-me cansada
Asfixiada pela massa inalcançável
Ali...
Onde o tempo não existe
E o vento chama sem voz
Aqui
Onde tu me chamas para dentro de ti.
Sempre
Aqui, ali, além
Presente
Do que nunca vem.

Será dia? Será hora?
Comboio
Ou será vida ou morte?
Alma


E deitei-me ausente
Mais uma vez presente
Em busca desse todo
Que se sente…


Não me quero aproximar
Tenho medo de uma faísca em falso
Mas preciso desse mar de fogo
Que me aquece o pé descalço.


E sentei-me ausente
Mais uma vez ausente
Porque o aqui, o ali e o além
Não pertencem ao presente
E busco desmesuradamente
Para encontrar num ensejo
Esse maléfico desejo
De minha voz que te chama
Engana…
Para mais perto de mim


Eu
Aqui,
Ali
Além
Dessa brisa que não vem
Será uma cela
Para muitos uma janela
Incapaz de abrir
Sem chave, um entrave
Onde não há o que seguir.
Porque o ausente
É um presente de Deus.


E deitei-me ausente
Desse sopro de chama quente
Para dormir por fim
Nesse todo que se sente
E que só é vida em mim.

Não há vida...

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Não há vida que doa
Não há dor que corroa
Não há palavras que se agitem
Não há estilhaços que se adornem
Não há vida!
Vida que o vento assopre
E esvoace as folhas secas
Vida que ferva o desalento
E o desfaça em brasas de carvão.
Não és tu
Mas sim o coração
Que bebeu silêncio.
E não há vida!
Não há vida que murmure
Somente a chama morta
Alenta por te ter criado um dia
Mas não nasceu alegria
E quebraste-te ao som da floresta
Onde os riachos cantavam
Mas não te beijavam
Onde está a vida que resta?
Não sou eu
Não vivo em mim
Não há vida que sobreviva
Não há chama que acenda o rastilho de pólvora
Não tens em mim o que preciso
Não consigo decifrar a esfinge
Nem enganar a certeza que se cinge
Só sei que não há vida aqui
E refaço-te mais uma vez da aurora
Para te desfazer em lágrimas
Porque acordo e não estás aqui.



Não há vida que assuma a dor
Não há dor que viva a dor
O desejo abraça a folhagem seca
O sangue que coagula nas veias
A respiração presa
E não há vida que adormeça
Para não haver vida que acorde.
Não há corda que me puxe do abismo
Não há voz que tenha voz
Que me chame para o outro lado
De ti, de mim, desse “nós”…
E vou-me perdendo no escuro
Entre amarras de vez em vez
Onde a sombra engole o sol
E o medo estremece o chão
E porque não grita o coração?
De vez em vez abano sangue
Respiro sangue
Sangue, Sangue, Sangue
Chamo-te a mim… Mas não me oiço…
Hoje queria que fosse Amanhã
E que esse Amanhã fosse o Amanhã
De 1000 anos adiantados
E porque não há dia
O sol não nasce em ti
Porque não há vida aqui…
Não há vida! Não há vida! Não há vida!
Vida de ferida
Com sangue ao menos fosse
Para esgotar e cessar…
E porque a morte é vida.



E já perdi o senso
Mas também o dispenso
Só ainda estou por aqui
Porque já não moro em mim
E assim e assim
De vez em vez vou revivendo
Em palavras mudas
O que nunca será ouvido.
Porque mais uma vez
E de vez em vez
Não estás aqui…



E não há vida!
Não há vida e jamais haverá viver!
Porque nunca aqui estiveste…
Porque nunca chegaste a morrer.